Texto O poder emocional dos trapos para a 4ª edição do Boletim Feminista da UMAR As mulheres na cultura consumista
Perdi-me
Perdi-me da minha sombra por entre as pedras.
Deixei o corpo repousar
de cada vez que me esquecia de sonhar.
Perdi-me do meu sabor matinal.
Esqueci o meu cheiro
por não viver.
Perdi-me do caminho
por não ver.
Onde fui?
Não sei.
Mas perdi-me de mim.
Palavras do agora, Rita Pinheiro, 13 Julho 2022
Procurava um lugar seguro
Onde pudesse poisar
Viajava sem destino
Sem saudades de ficar
Mas as ondas sussurraram
Que um dia poderia parar
Para absorver a beleza
Que vive através do Mar
Palavras do agora, Rita Pinheiro
15 Junho 2022
Cama-das/des...
A partir dos níveis de energia de um átomo, os elétrons distribuem-se em camadas. O maior órgão do corpo humano divide-se em três grandes camadas que por sua vez são compostas por outras sub-camadas.Sob esse corpo, como máscaras, manipulamos várias camadas de tecidos, também compostos por outras camadas. Umas mais densas do que outras, umas mais brilhantes e proeminentes do que outras, algumas invisíveis a olhos nu, outras que forçamos em esconder.
Camadas que reagem, que sentem, que repelem ou atraem, com cheiros e cores, com vida. Desta acumulação, ou anulação, das diversas camadas surgimos como espíritos. Somos então assim uma simbiose de infinitas camadas que procuramos incessantemente aprender a descamar.
Palavras do agora, Rita Pinheiro, 7 Junho 2022
Mini me…
Quantos sonhos guardados.
Uns vão acontecendo, outros no entanto, parecem demasiado longe.
Por vezes, por entre as pestanas brilha uma luz, um rastro de uma conquista.
E ela lá sobe mais uns degraus.
-Vá tu és capaz! Diz entre dentes.
Cambalhotas, pinos, sorrisos, horas de espera… o comboio está sempre a passar.
Quando dá por ela, mais um minuto voou, algo desperdiçou, mas um abraço ganhou. Ganha sempre uma pitada de qualquer coisa. Diz que é uma questão de perspectiva.
Corre atrás, do tempo, da vida, da própria sede. Não desiste.
Através deste olhar curioso com o qual desperta, segue a aventura.
Por vezes fica entorpecida, mas como não se esquece onde sonha chegar, continua a lutar.
Palavras do agora, Rita Pinheiro, 15 Fevereiro 2022
Camaleoa
Texto publicado a propósito do ciclo “Dramaturxias itinerantes / Dramaturgias itinerantes”. Trata-se de um intercâmbio entre o Conselho da Cultura Galega, o Camões-Centro Cultural Português em Vigo e a Escola Superior de Arte Dramática da Galiza, no qual estas instituições se aliam para promover o diálogo criativo entre escritoras dramáticas contemporâneas de Portugal e a Galiza. Em 2021 eu representei Portugal e a Galiza teve a dramaturga Laura Porto.
Destino
Culpam me pelo meu passado
Culpam me pelas minhas escolhas
Mas eu acredito que o nosso destino
é à nascença traçado
Sem poder para o alterar
com força suficiente para o moldar
para como mulher me afirmar
20 Novembro 2021, Rita Pinheiro
Estas palavras são ecos, medos, reflexos….
vejo-me, mas não me sinto
toco, mas não me mostro
beijo, mas não vivo
Ensino sobre o corpo, mas não partilho da entrega
Caminhos percorro à procura da luz, que surge de repente encadeando
Escolho descobrir o que o vento tenta encobrir, mas há sempre um sol que brilha que não me deixa desistir
Eu vejo-me e tu?
Eu sei quem sou, mas não me esqueço que a sombra é poderosa. Não fujo dela, antes contorno as suas curvas de forma habilidosa para trazer a estes poros um sopro que os reanime.
Setembro 2021, Rita Pinheiro
Manifesto
Eu não sou a favor do teatro que condiciona
Eu não sou a favor do teatro que segmenta
Eu não sou a favor do teatro que iguala
Eu não sou a favor do teatro que separa
Eu não sou a favor do teatro que é distante
Eu não sou a favor do teatro que não imortaliza
Eu não sou a favor do teatro que parece, mas não é
Eu não sou a favor do teatro que não faz suar
Eu não sou a favor do teatro que robotiza
Eu não sou a favor do teatro que bloqueia
Eu não sou a favor do teatro dentro de um quadrado
Eu não sou a favor do teatro que precisa de internet
Eu não sou a favor do teatro que depende de conhecimentos técnicos
Eu não sou a favor do teatro que não se ouve
Eu não sou a favor do teatro que não permite ver o todo
Eu não sou a favor do teatro que não faz eco
Eu não sou a favor do teatro que não apela ao toque
Eu não sou a favor do teatro que não tem cheiro
Eu não sou a favor da arte que impõe
Eu não sou a favor da arte que cega
Eu não sou a favor da arte que se vende numa embalagem
Eu não sou a favor da arte que é fundamentalista
Eu não sou a favor da arte que não arrepia
Eu não sou a favor da arte que não causa efeito
Eu não sou a favor da arte que não reflete
Eu não sou a favor da arte que não emancipa
Eu não sou a favor da arte inacessível
O que é que isto é? Não sei bem responder.
O que é que isto,não é? Teatro não é com certeza
8 de Julho 2021, Rita Pinheiro
Poema “Com(o) | (sur)preender”
Eu e tu somos iguais
Com sonhos e medos reais
Não interessa a cor, sexo ou tamanho
À procura do amor vamos navegando
O caminho por vezes é obscuro
Umas pedras lá vão se atravessando
Mas desejar por algo melhor
É o que me vai alimentando
Dás-me a mão, dou-te um sorriso
Dás-me um minuto, ganho o dia
Percorrer a estrada da vida
Só faz sentido com empatia
Mas todos temos o poder
E tudo pode acontecer
O segredo do sucesso
É saber compreender
31 Janeiro 2021, Rita Pinheiro